domingo, maio 20, 2007

A quarta via?

Tony Blair o mais recente desertor do cargo de primeiro ministro do Reino Unido, é um dos defensores da chamada Terceira Via, o caminho do meio, nem esquerda nem direita, que até pouco tempo foi dominante na Europa. Até pouco tempo porque uma nova onda conservadora parece estar ganhando força, principalmente depois que o novo presidente da França, Nicolas Sarkozy, se elegeu, prometendo a boa e velha agenda neoliberal: flexibilização das relações trabalhistas, isenção de impostos, medidas mais rígidas no combate ao crime e maior rigor na questão da imigração.

A terceira via se baseia numa perceção de que a sociedade atual está cada vez mais reflexiva. Em suma, ela aceita a globalização como um fenômeno irrefreável, que contribui para a formação de uma sociedade mais reflexiva. É essa sociedade mais reflexiva que cada vez mais se preocupa com o meio ambiente, uma preocupação impalpável e menos certa que o risco anterior da terceira guerra mundial no enfrentamento dos blocos comunista e capitalista. Ao mesmo tempo seus defensores aceitam tomar algumas bandeiras da esquerda clássica, como a emancipação política e o welfare state (Estado de Bem Estar Social -- aquele provedor, de empresas estatais, como foram a Eletrobrás e Telebrás privatizadas por FHC, que aliás é considerado por alguns um dos adeptos da terceira via).

Diante do recrudescimento das relações internas na Europa, principalmente por uma xenofobia estimulada por atentados terroristas, estimulados, por sua vez por guerras estúpidas por controle do petróleo, promovidas pelo Tio Sam e avalizadas por boa parte da comunidade ocidental, será que podemos falar numa terceira via? Diante de uma esquerda sem discurso, de uma direita que não quer mais ser reconhecida como tal (já que, pelo menos na América Latina, o termo já se tornou pejorativo), a terceira via deveria ser o caminho conciliador, que permitiria à sociedade seguir em frente, tomando aquilo que há de melhor nos dois lados, ou pelo menos estabelecendo alguns consensos universais compatíveis a todos. No entanto, o que acontece é que, ao que tudo indica, principalmente devido ao medo de prosseguir, estamos inclinados pegar a quarta via, o retrocesso. Tome-se aí o motivo pelo qual o próprio Blair pediu para sair, por ter se enfiado no atoleiro do Iraque, seguindo as ordens de Bush.

Em face a um mundo globalizado, mais informado, a democracia precisa deixar de ser hipócrita. Não podemos exigir mais do mesmo, nem Chávez nem Bush, nem Requião nem Serra. É preciso aproximar mais o cidadão das esferas do poder. É preciso sim estimular a reflexividade social, democratizar a democracia. Isso num país como o Brasil ainda se restringe a uma parcela muito pequena da população, que antes de ser reflexiva precisa se alimentar e adquirir uma formação intelectual básica. Só assim para a terceira via funcionar no Brasil, só assim para o desenvolvimento substituir o jeitinho, que aliás, é preferível a qualquer radicalismo.

quarta-feira, maio 09, 2007

A importância da fofoca

O conhecido psiquiatra José Ângelo Gaiarsa, que durante anos falou na TV Bandeirantes define a fofoca, em seu Tratado Geral sobre o tema, como uma censura, um modo de controle social. Quem faz fofoca, sob sua ótica, ou tem inveja, ou desprezo. Os fofoqueiros são as pessoas que tendem a manter os paradigmas, tendem a quedar-se calados e comportados, sem questionar a ordem vigente, mantendo o "sempre foi assim", como explicação para todas as coisas.

O paradigma, como os leitores sabem, é muito bem explicado por aquela metáfora internetesca que circulou por aí, que narrava uma experiência científica com cinco macacos enjaulados. Na experiência, os macacos, eram presos em uma jaula com uma pequena porta, que dava para uma jaula em que apenas um macaco cabia e onde havia um cacho de bananas. Quando algum macaco deixava a jaula para pegar as bananas, os outros quatro levavam um jato d'água fria. Assim, depois de pouco tempo, nenhum dos macacos entrava para pegar as bananas, já que os outros o impediam a socos e pontapés. Estabilizada a situação, os cientistas começaram a substituir os macacos velhos por novos, um de cada vez. Sempre que o novato chegava, tentava pegar as bananas e era imediatamente impedido pelos veteranos, até que desistia do intento. Os cientistas prosseguiram a substituição até que todos os macacos iniciais fossem substituídos. A jaula ficou finalmente com cinco macacos que nunca tinham levado um jato d'água fria, mas que mesmo assim impediam os outros de pegar a banana. Estabeleceu-se um paradigma.

Assim é a sociedade, cheia de paradigmas cujas origens nós muitas vezes nem sabemos explicar, mas que mesmo assim nos mantemos seguidores deles. Por isso fofocamos. Por isso a primeira filha que desiste da faculdade, ou aquela mulher que está que está no quinto casamento são vítimas da fofoca alheia, por isso o gênio inventor é vítima da inveja. A mulher, a filha e o inventor, aos seus modos, quebram paradigmas, posicionam-se contra a ordem vigente, que ninguém mais sabe quem estabeleceu, mas a que todos continuam seguindo. No fundo os fofoqueiros têm inveja, eles que não conseguem realizar seus desejos, martirizam e ferem aqueles que realizam suas próprias vontades. Ser fofocado, portanto, é um reconhecimento por parte do fofoqueiro -- é um atestado da competência e coragem que ele, o fofoqueiro, não teve e que inveja tanto.